Prazeres / Sabores

Akla e Eddy Melo. Um açoriano em Lisboa

Aos 67 anos, o chef evoca as memórias gastronómicas das suas raízes, Terceira e São Miguel, nos Açores, para criar um alinhamento especial no restaurante do hotel InterContinental Lisbon. Os ingredientes, esses, viajam de lá para cá.

Foto: D.R
20 de julho de 2023

Junto ao Parque Eduardo VII, acomodamo-nos no restaurante Akla do Inter Continental Lisbon, onde temos a oportunidade de conversar com parcimónia com o Eddy Melo, mesmo antes da azáfama da hora de almoço. "A minha intenção era fazer um livro, mas tornou-se um tanto complicado e com o conhecimento que tinha optei por este menu", começa por desvendar o chef executivo de 67 anos sobre o novo menu Açores, razão da nossa visita ao Akla. "É mais ou menos uma viagem pelas duas ilhas. Nasci na Terceira, a minha mãe é de lá e aos cinco anos fui para São Miguel, a terra do meu pai. E depois para a América do Norte, Canadá [onde fiquei 25 anos]", continua o chef que ainda teve uma passagem breve por um resort privado na Jamaica, estabelecendo-se no continente em 1993, onde permanece até hoje. Uma vida cheia tal como a proposta que nos traz hoje.

O menu apresenta-se à carta, em seis pratos: quatro principais e duas sobremesas. Começamos pelo arroz malandro com algas dos Açores, fava e alface do mar, queijo de São Jorge de 36 meses, abóbora e cenoura bio assada com mel e anona (€19). Este foi o favorito: cremoso e com as cores da natureza, bonito no prato e morno ao paladar. "Mandei vir sete ou oito qualidades de algas. Nem todas são aptas para o arroz. Umas são demasiado duras, outras desfazem-se", conta-nos a propósito da saga que foi toda a experimentação e fase de testes. "Primeiro o produto vem [todo dos Açores], mas para equilibrar o que quero, tenho de prová-los um a um… no caso das algas, a cru e depois cozinhadas". 

Arroz malandro com algas dos Açores, fava do mar, alface do mar, abóbora, cebola, queijo de São Jorge 36 meses, cenoura bio assada com tomilho, mel e anona.
Arroz malandro com algas dos Açores, fava do mar, alface do mar, abóbora, cebola, queijo de São Jorge 36 meses, cenoura bio assada com tomilho, mel e anona. Foto: D.R

Mas se as algas foram malandras como o arroz, o prato que lhe deu mais gosto criar foi mesmo o chicharro dos Açores recheado com inhame das Furnas e morcela grelhado a carvão zero (€32). "Para a maior parte das pessoas é um peixe banal. Não é. Estes chicharros são de quilo. São limpos e só depois retiramos um bocadinho do lombo, o que depois é servido", desvenda enquanto prossegue nos segredos para a mistura com o inhame e a morcela.

Também a lula e o atum saíram, no seu juízo final, com os paladares todos, referindo-se às restantes opções de lula fresca grelhada a carvão zero com mousseline de batata com coentros, molho vilão, limão galego e pico de galo (€28) e o lombo de atum patudo de São Miguel grelhado com pimento banana e batata doce assada (€32). Acenamos em concordância, de boca cheia. 

Lula fresca dos Açores grelhada em carvão zero, mousseline de batata com coentros, molho vilão, limão galego e pico de galo.
Lula fresca dos Açores grelhada em carvão zero, mousseline de batata com coentros, molho vilão, limão galego e pico de galo. Foto: D.R

Nesta viagem gastronómica pela Terceira e São Miguel, a proposta não passa pela carne, caso se esteja a questionar por esta altura. É propositado, "não temos pratos de carne. Temos alcatra, mas é verão, não é o momento de pôr um prato de alcatra [seria muito pesado]. Vamos passar a estação quente e perceber como corre", clarifica o chef enquanto denota a qualidade do produto, contando como nas ilhas é fácil um bife de novilho brilhar a solo só com pimenta e um pouco de alho. 

Lombo de atum patudo de São Miguel grelhado no josper em carvão zero, pimento banana, batata doce assada e redução de cebola de cortume.
Lombo de atum patudo de São Miguel grelhado no josper em carvão zero, pimento banana, batata doce assada e redução de cebola de cortume. Foto: D.R

No final, as sobremesas. Na dúvida provámos as duas. O bolo micaelense, com cremoso de chá de Gorreana de São Miguel e sorbet de anona (€10), mais consensual, e o inesperado ananás dos Açores grelhado com espuma de queijo da ilha picante e sorbet de araçal (€10). "Quem já foi aos Açores perceberá melhor o menu, evidentemente", conta enquando se junta à mesa para perceber a reação a esta última sugestão, uma verdadeira explosão de sabores. 

Ananás dos Açores grelhado no josper com espuma de queijo da ilha picante e sorbet de araçal.
Ananás dos Açores grelhado no josper com espuma de queijo da ilha picante e sorbet de araçal. Foto: D.R

Num futuro próximo, Eddy Melo não esconde o desejo de se aventurar gastronomicamente arquipélago fora: "Passar para outras ilhas? Já visitei várias. Provavelmente seria uma opção, depende da adesão e de como tudo for feito". Afinal, "a maioria dos portugueses e do mundo só conhece a Madeira, mas pós pandemia fez sentido uma grande parte visitar os Açores. Mais natureza, mais perto, não tanta população", revela em discurso pensativo. Para já, o seu objetivo próximo é que os comensais sintam todos os paladares de lá e que sim, que isso lhes provoque uma curiosidade maior para visitar a sua terra natal. 

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De momento, o Akla mantém a carta anterior pelo que o novo menu Açores poderá ser degustado, em simultâneo, ao almoço e jantar, durante os próximos meses, ou pelo menos até ao final do verão.

Onde? Rua Castilho 149D, Lisboa. Quando? Todos os dias das 12h30 às 15h e das 19h às 22h30 Reservas: 213 818 700

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