Prazeres / Artes

Perceber o Plástico. A nova exposição do MAAT convida-nos a repensar o valor deste material

“Plástico: Reconstruir o Nosso Mundo” inaugurou no Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia de Lisboa e conta a história da ascensão e impacto do mais controverso dos materiais. “Acredito que quando conhecemos a história de algo, podemos fazer melhores escolhas para o futuro”, conta à Must Anniina Koivu, curadora da exibição.

Foto: @joanalinda
31 de março de 2023

Para onde quer que olhemos, vemos plástico. É um facto, sob todas as formas, lá está ele. E agora também nas nossas cabeças, já que a narrativa dos últimos anos – prezada seja – com destino à sua erradicação, tem vindo a ganhar força. O material mais impactante de todos os tempos passou, em 150 anos, de revolucionário e progressista a inconveniente e letal

O MAAT - Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia com o apoio da Fundação EDP aliou-se ao Vitra Design Museum e ao V&A Dunde e inaugurou nas suas instalações em Lisboa a exposição "Plástico: Reconstruir o Nosso Mundo".  Aquando da apresentação oficial à imprensa, tivemos a oportunidade de ser guiados neste universo por Anniina Koivu, uma das sete curadoras responsáveis pela mostra.

O plástico, é o material mais impactante de todos os tempos.
O plástico, é o material mais impactante de todos os tempos. Foto: @joanalinda

"Com um profundo background em Design e Arquitetura, as nossas instituições estão interessadas não só em perceber a big picture como refletir este tópico através dos olhos do designer", revela Anniina Koivu, diretora de Master Theory na ECAL/Universidade de Artes e Design em Lausanne e copywriter, curadora e consultora freelancer, a viver entre a Suíça e Milão. "Como sempre, uma exibição deverá provocar o pensamento, oferecer informação surpreendente e educar-nos e fazer-nos pensar, assim como estimular-nos a olhar para as coisas de forma diferente."

A exposição Plástico: Reconstruir o Nosso Mundo começou a ser pensada há três anos, tendo sido desenvolvida inteiramente durante a pandemia. "Os sete curadores, onde me incluo, nunca se encontraram pessoalmente. Estávamos sediados em Weil am Rein [localização do Vitra Design Museum], na Escócia, em Londres e Milão", desvenda Anniina. Dividida em três secções interligadas, a exibição no MAAT conta a história do plástico de modo sequencial, seja através de imagem e vídeo, quatro centenas de objetos ou mesmo maquetes e infográficos. Imergimos primeiramente numa instalação videográfica, um prelúdio de 9 minutos da autoria de Asis Kahan que resume os últimos dois biliões de anos da história da Terra, da vida microscópica dos oceanos, passando pelo domínio da indústria petrolífera, até à infiltração dos mioplásticos na vida marinha. Uma primeira refleção sobre a relação geológica entre plástico e natureza, ao som de Danúbio Azul, do compositor Johann Strauss. Cuidadosamente selecionada, esta valsa foi apresentada na Exposição Universal de Paris em 1867, onde o plástico semissintético Parkesine – o primeiro a ser feito e patenteado pelo homem – foi premiado.

A exposição
A exposição "Plástico: Reconstruir o Nosso Mundo" está exibição no MAAT - Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia. Foto: @joanalinda

Depois seguimos para o segundo núcleo denominado Synthetica, essencial para compreender a origem e necessidade do plástico. Anniina Koivu explica-nos que de facto, o seu fabrico a partir de materiais naturais já ocorria há milhares de anos, sendo que no final do século XIX a sua exploração se tornou gritante. A procura aumentou com o poder de compra decorrente da industrialização e a sua busca incessante conduziu a uma sobre-exploração dos recursos naturais, ameaçando as espécies. Tal como o momento de shifting em que nos encontramos agora, foi aquele final de ciclo que potenciou a busca de uma nova solução, encontrada na experimentação com materiais sintéticos.

Esta exposição começou a ser pensada há três anos, tendo sido desenvolvida inteiramente durante a pandemia.
Esta exposição começou a ser pensada há três anos, tendo sido desenvolvida inteiramente durante a pandemia. Foto: Joana Linda

Na secção Petromodernidade é explorada esta descoberta, a invenção de novos plásticos como nylon, vinil, acrílico, com a ascensão da indústria petroquímica. A sua utilidade na segunda grande guerra, e transição para um fabrico a baixo-custo potencia então a entrada em livre demanda nas nossas casas, tornando-se ubíquo no quotidiano e mundo em geral.

Anniina Koivu detém-nos aqui, "o que eu acho incrivelmente interessante e em que acredito profundamente é que quando conhecemos a história de algo, podemos fazer melhores escolhas para o futuro. O curioso é que tendemos a viver em ciclos, por isso, quando há um problema procuramos encontrar soluções para tal, até que chegamos a um ponto de rutura em temos de começar a pensar de novo". Foi o que nos aconteceu. O excesso colossal proveniente deste uso desmedido "acabou por transformar-se numa maldição", como pode ler-se na última paragem da exposição, a secção RE –, que nos convida a pensar.

Está dividida em três secções interligadas: um prelúdio de 9 minutos, um segundo núcleo denominado Synthetica e a secção petromodernidade.
Está dividida em três secções interligadas: um prelúdio de 9 minutos, um segundo núcleo denominado Synthetica e a secção petromodernidade. Foto: Joana Linda

Percebemos que não se pretende uma demonização do plástico neste espaço reflexivo, mas antes a sua compreensão. É preciso um esforço coletivo de criatividade para a reconstrução do mundo. A nível local e global, individual e social são necessárias novas formas de reduzir a problemática da poluição, muito pelas soluções dos cientistas, ativistas e legisladores, apresentadas nesta última seção da mostra, como pelos designers. "A aplicação imediata de um material em produto tem sempre o designer como intermediário e é interessante perceber como é que o seu papel nos pode ajudar a mudar aquilo por que estamos a passar", enfatiza Anniina. "É alguém compreende a industria, , os materiais e os consumidores e pode ter um papel muitíssimo importante aqui", remata.

Segundo a curadora Anniina Koivu é importante repensar o valor que damos ao plástico, tal como a outros materiais como o ouro, e atuar em conformidade. A sua extinção não é o que mais lhe faz sentido, até porque em áreas como a saúde torna-se imprescindível.
Segundo a curadora Anniina Koivu é importante repensar o valor que damos ao plástico, tal como a outros materiais como o ouro, e atuar em conformidade. A sua extinção não é o que mais lhe faz sentido, até porque em áreas como a saúde torna-se imprescindível. Foto: @joanalinda

Depois, torna-se importante repensar o valor que damos ao plástico, tal como a outros materiais como o ouro, exemplifica a curadora, e atuar em conformidade. Pensar na sua extinção não é o que mais lhe faz sentido, até porque em áreas como a saúde torna-se imprescindível. "O que está diferente é que sempre ansiamos para que a indústria da tecnologia nos trouxesse mudança, mas creio que agora é a primeira vez em que as pessoas também podem fazer a sua parte. Nunca tivemos isso antes, este tipo de movimento público em massa". No final, e já em despedida reforça a mensagem: "Vai sempre passar pelas escolhas pequenas que cada um de nos pode fazer e não pela narrativa ‘a partir de amanha vou abolir o plástico da minha vida’, podemos interferir sim nas pequenas escolhas…"

A exposição Plástico: Reconstruir o Nosso Mundo inaugurou a semana passada eestará aberta até agosto de 2023. No primeiro domingo de cada mês a entrada no MAAT é gratuita para o público em geral, por isso aproveite já este 2 de abril.

Onde? Avenida Brasília, Lisboa Quando? De quarta-feira a segunda-feira das 10h às 19h. Contacto 210 028 130

Saiba mais Artes, MAAT, Plástico: Reconstruir o Nosso Mundo, Exposição
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