Prazeres / Sabores

Série Ímpar: de vinhas velhas e tortas se fez um branco incrível

Começamos por um terroir único, seguimos por um vinha que foi um achado e aproveitamos para fazer um daqueles vinhos que já não se fazem mais. Eis o Retorto 2018, um vinho branco Ímpar.

09 de julho de 2021 | Bruno Lobo

Todos os seres vivos nascem, envelhecem e morrem. Está escrito no código genético, e não há como dar a volta ao texto, embora seja bem verdade que nem todos definham de igual forma. Alguns parecem até enganar o tempo, como um vídeo de Instagram da ex-top Elle Macpherson, em biquíni, aos 57 anos, tão bem ilustra. 

Com as vinhas acontece algo semelhante, algumas perdem-se para a vida, e outras melhoram com a idade. Não vão propriamente enganar o tempo, porque envelhecem pequeninas e engelhadas, tal como uma anciã, mas aproveitam o passar dos anos para se adaptar na perfeição ao solo e às condições climatéricas do local. As raízes penetraram fundo e sabem muito bem onde ir buscar água, e as folhas por onde anda o sol. Apesar da fragilidade própria da idade, acabam por ser até mais resilientes a enfrentar certas adversidades, como anos de seca, do que as suas irmãs mais novas. Também são bastante menos produtivas, mas aquilo que entregam não tem qualquer paralelo em concentração, nem em complexidade. É neste cenário que nasce o Retorto, em homenagem às formas incríveis das suas videiras.

Série Ímpar Retorto 2018, Alentejo, Portalegre. Edição limitada a 2.965 garrafas, com um PVP recomendado de € 60.
Série Ímpar Retorto 2018, Alentejo, Portalegre. Edição limitada a 2.965 garrafas, com um PVP recomendado de € 60. Foto: D.R.

O palco consegue ser dramático, em plena Serra de São Mamede, esse terroir mágico tantas vezes gabado. Foi lá que a equipa de enologia da Sogrape descobriu um campo de videiras plantadas a 640 metros de altitude, bem retorcidas pelo tempo e preservando castas de um encepamento muito antigo, como nos explica Luís Cabral de Almeida, o responsável máximo pelo vinho: "nestas vinhas velhas pude fazer um trabalho de ourives. Isto é um verdadeiro tesouro para qualquer enólogo"

O resultado chegou agora ao mercado. Um blend de 2018, onde predominam as castas Arinto, Tamarez, Roupeiro, Bical e Fernão Pires. Estagiou 17 meses em barricas usadas de carvalho francês, barricas grandes, com 225 e 500 litros, para se conseguir uma madeira perfeitamente integrada, que não sobressai. Apresenta-se numa cor dourada, bem reveladora da sua riqueza, e é um vinho poderoso, cheio de complexidade e de sofisticação aromática. Frescura e acidez perfeitas, ao ponto de estarmos a falar de um branco com capacidade de guarda de 20 ou mais anos, o que é notável. Isto para quem conseguir resistir a manter a garrafa fechada, naturalmente. O ideal seria juntar mais do que uma à coleção, abrindo a primeira agora, para prazer imediato, e guardando a(s) outra(s) para provar daqui por uma ou duas décadas.

Luís Cabral de Almeida, o responsável máximo pelo vinho diz  que estas vinhas são
Luís Cabral de Almeida, o responsável máximo pelo vinho diz que estas vinhas são "um verdadeiro tesouro para qualquer enólogo" Foto: D.R.

Este Retorto é o segundo episódio de uma série que começou há cerca de dois anos, com o lançamento de outro branco único, um Sercialinho da Bairrada. Dá pelo nome de Ímpar, porque a ideia é nunca repetir o mesmo vinho na chancela, pois foi esse o desafio que o presidente da Sogrape, Fernando Guedes, fez às equipas de enologia: "surpreendam-nos com vinhos diferentes, únicos" lançou-lhes, e o estímulo dificilmente não podia ser mais apelativo. Numa empresa - a maior empresa do sector - com 980 hectares de vinha, do Minho ao Alentejo, há muito por onde procurar, pequenos micro terroirs que marcam castas raras, e por isso aguardamos já ansiosamente pela próxima surpresa. Até lá temos este Retorto para nos deliciarmos. Uma maravilha de produção limitada, para ser servida entre os 10º e os 12ºC, dando-lhe tempo no copo, para que possa revelar todas as suas qualidades - é que são muitas...

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