Prazeres / Sabores

Um restaurante para se perceber Davvero o que é a cozinha italiana

O Davvero, no Sublime Lisboa, é um convite irrecusável para dar um giro por Itália, começando por um Bellini e terminando com um tiramisu- como deve ser.

14:02 | Bruno Lobo
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Isaac Kumi nasceu no Gana, mas mudou-se para Treviso ainda em criança, e foi nessa cidade, às portas de Veneza, que se apaixonou pela gastronomia transalpina. Aos 14 anos já estudava cozinha e, terminada a formação, arranjou um primeiro emprego de sonho no Cipriani. O supergrupo de gastronomia italiano conta atualmente com mais de 20 moradas internacionais, além de hotéis e residências espalhadas pelo mundo, mas a alma continua firmemente enraizada no Harry’s Bar de Veneza, onde tudo começou — e onde se inventaram coisas como o cocktail Bellini ou o carpaccio. Kumi estreou-se em Abu Dhabi e integrou depois a task force responsável pelas novas aberturas, tendo passado por Miami, Monte Carlo ou Punta del Este, antes de assentar arraiais em Ibiza como head chef do Cipriani local. Foi lá que o Sublime o descobriu e convenceu a trocar a ilha espanhola por este palácio do século XIX em Lisboa, perto das Amoreiras.

A ideia era simples: usar a fórmula de sucesso dos Cipriani — comida italiana autêntica, num ambiente mais sofisticado — e replicá-la no projeto nacional. Acertaram em cheio.

Não vamos aqui discutir qual é o melhor italiano de Lisboa — há muitos e bons, e isso é sempre uma questão de opinião —, mas é seguro afirmar que o Davvero ocupa um lugar entre os melhores, com bom produto italiano e nacional, e boa técnica. Nossos, sobretudo a carne, o peixe, o marisco e os legumes. De Itália, vêm todos os produtos cuja identidade justifica essa importação, apostando em pequenos produtores artesanais. Já as massas frescas são, naturalmente, produzidas no restaurante.

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A carta é extensa e viaja por diferentes regiões de Itália — do Véneto natal de Isaac à Puglia de Mauro Abignente, o chef de pastelaria, lá mais para o sul. Pelo meio, vão fazendo paragens na Lombardia, Toscânia ou Lázio.

A estrutura do menu não podia ser mais classicamente italiana, começando pelos Stuzzichini (aperitivos), seguindo para os Antipasti (entradas), Primi Piatti, Secondi, com diferentes Contorni (acompanhamentos), e finalmente os Dolci e Formaggi. Para ler tudo com pronúncia italiana, evidentemente.

As doses são generosas, como se percebe imediatamente pelo tamanho das bolinhas de Baccalà mantecato, uma brandade de bacalhau que fez muito mais do que abrir o apetite. Nos Antipasti, há nove opções, mas o coração balançou entre o Carpaccio Davvero, um dos ex-libris do restaurante, e a alcachofra frita com maionese de anchovas. Terminou esta por sair vencedora, porque é muito difícil comer boa alcachofra neste país. Boa escolha: estava uma delícia — tanto o coração da alcachofra, tenro e suculento, como a maionese de anchovas.

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Nas massas e risotos (Primi), também há muito por onde escolher, começando pelo gnocchi negro com choco e salmonete, pappardelle de cogumelos selvagens ou ravioli de ricotta e espinafres. A escolha acabou por recair num superclássico Spaghettoni cacio e pepe (queijo pecorino e pimenta preta), que não chegou a convencer. Pareceu-nos, mesmo, o prato menos conseguido da refeição.

Nos Secondi, optámos pelo Piccatine al limone, uns escalopes de vitela supersaborosos, mas ficámos igualmente com vontade de provar o ossobuco alla milanese, com risoto de açafrão, que dizem ser extraordinário. Ficará para uma próxima vez. A terminar, um delicioso tiramisù fechou uma excelente refeição.

Para acompanhar, escolhemos um simpático branco siciliano, com uma acidez delicada, mas suficientemente presente para acompanhar os diferentes pratos. É também a opção mais barata a copo (6,5 euros, 26 a garrafa), numa carta sem muitas opções nesse capítulo. Felizmente consegue juntar propostas muito interessantes dos dois países — Itália e Portugal — à garrafa.

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O Davvero não é um restaurante barato, mas está em linha com outras opções semelhantes. Esta refeição, por exemplo, fica por 92 euros. Duas pessoas, sem bebidas. A sala oferece 47 lugares, divididos por duas áreas, nem espaço pensado pelo Andringa Studio com cores fortes e luz ténue, que ajudam a criar um ambiente requintado, mas igualmente descontraído — por vezes até romântico, sobretudo à noite. À hora de almoço, a sala estava bastante composta — e não eram só expats ou turistas habituados a outros preços. Havia de tudo, numa miscelânea de portugueses, espanhóis, brasileiros e até italianos, seguramente com saudades de casa.

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