Conversas

Chef Vincent Farges: “Não se pode fazer cozinha Michelin em casa”

Entrevistámos vários chefs que se deparam, mais uma vez, com as portas dos seus estabelecimentos fechados. Vincent Farges, do Epur, antecipa aqui como será a restauração do futuro: nem tudo é animador, mas quem cozinha por gosto não cansa.

Foto: Luís Ferraz / O Apartamento
27 de janeiro de 2021 | Rita Silva Avelar

É nos bastidores do Epur, no Largo da Academia Nacional de Belas Artes, em Lisboa, restaurante distinguido com uma estrela Michelin, que podemos encontrar Vincent Farges, o chef francês que sempre primou por uma cozinha fiel à Natureza, com uma filosofia de "horta para o prato" aliada às melhores técnicas da alta cozinha.

Farges é da opinião de que nada bate a experiência gastronómica no seu restaurante, mas não baixou os braços nem perdeu o ânimo durante a pandemia, e para este segundo confinamento criou o menu Epur em casa, com pratos que pela descrição deixam logo água na boca (creme de castanhas com trufas pretas e guisado de veado com Touriga Nacional acompanhado de um gratinado de batatas com queijo do Pico são suficientemente apelativos, certo?) À MUST, Vincent Farges, que esteve 10 anos no Fortaleza do Guincho antes de abrir o Epur, revela como vive o momento, marcado pela incerteza, mas também pela esperança.

Quais eram os seus planos para 2021, no Epur? Antecipava um novo confinamento?

Eu realmente não sei dizer se estava preparado para um novo confinamento a seguir ao que aconteceu no ano passado. Mas sabia que havia de acontecer, a seguir aos fins de semana em que estivemos fechados até ao Natal. Depois do Governo tomar as decisões do Natal para aliviar alguma tensão pública, aconteceu termos que fechar de novo. Não tenho a certeza de que a melhor solução seja fechar sempre tudo, acho que devíamos combater [a pandemia] de uma outra maneira, mas bom, eu sou cozinheiro. Expetativas para 2021? Deixar acabar este confinamento e depois veremos…

Como se preparou para este segundo fecho prolongado?

A "vantagem", por assim dizer, foi que vivemos este confinamento em março do ano passado, desta vez já sabíamos mais ou menos, até pela conversa do Governo, que íamos fechar. Preparámo-nos melhor com o delivery e o take-away. Mas não estávamos era à espera que fechássemos mesmo.

Chef Vincent Farges, no Epur.
Chef Vincent Farges, no Epur. Foto: Luís Ferraz / O Apartamento

Em que consiste o menu Epur em casa? As pessoas terminam os pratos em casa, ou já estão prontos?

O take-away que eu faço não é um take-away para ser servido quente, encomendado duas horas antes. Aqui temos um conceito completamente diferente. É muito complicado para mim fazer e enviar um prato quente dentro de meia hora. As encomendas fazem-se no dia anterior [com um dia de antecedência], e depois ou comem ou reaquecem em casa. A essência do Epur é levada até casa, mas não se pode fazer cozinha Michelin da mesma forma. Para apreciar realmente o nosso nível de gastronomia tem que se estar aqui sentado à mesa. Não é a mesma experiência, mas a ideia é continuar a fazer boa comida, partilhar emoções e o melhor da gastronomia. Continua, claro, a ser a cozinha do Vincent Farges.

Tem aproveitado este tempo para se dedicar a outras coisas? Ou tem estado focado no momento?

Primeiro que tudo estou focado nas contas todas que acumulámos desde o ano passado. Equilibrar as contas, as finanças, até ao final do confinamento. E é algo que consome muito tempo. E apesar de estarmos fechados por decisão do Governo, há contas que temos de continuar a pagar. Cada euro conta. Para já, não tenho cabeça para outras coisas, vivo o dia a dia, para ver como evolui a economia.

Chef Vincent Farges, no Epur.
Chef Vincent Farges, no Epur. Foto: Luís Ferraz / O Apartamento

O Governo português poderia estar a ajudar mais a restauração?

Poderia, mas um país como Portugal não estava preparado para sustentar uma pandemia destas. Porque não é só o setor da restauração que está em crise, é a economia total. Mas sim, a restauração é muito importante sobretudo para o Turismo.

O que é que veio para ficar com esta pandemia?

Eu acho que será, talvez, a procura para ir jantar fora. O português gosta muito de ir jantar fora, mal se deu o desconfinamento no ano passado, boom! Acabou-se a história do take-away, e acho que isso vai continuar, mas com muito mais cuidado. As carteiras portuguesas não irão aguentar tanto, vai haver menos dinheiro para grandes jantares. Penso que continuarão a aproveitar o sol e os petiscos, mas não sinto que os restaurantes de topo irão continuar a ter muitas pessoas. É complicado.

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