Na passada segunda-feira, dia 23 de junho, decorreu a terceira e última conferência do ciclo organizado pelo Jornal de Negócios, em parceria com a Must. Depois de duas edições - Outlook do Luxo e Os Investimentos do Luxo — centradas, respetivamente, no papel do luxo como motor de desenvolvimento económico, coesão territorial e inovação, e nas dinâmicas de investimento e impacto económico dos bens de luxo, esta última conferência — intitulada Grande Conferência — teve como foco central a adaptação das marcas às novas gerações, o impacto do luxo no mercado imobiliário e as estratégias para a internacionalização do luxo português.
A sessão abriu com a intervenção de Diana Ramos, diretora do Jornal de Negócios, que agradeceu aos parceiros e participantes, sublinhando que "o mercado do luxo tem um enorme potencial". Um potencial que, como destacou, fundamentou a realização deste ciclo de três conferências ao longo dos meses de março, abril e junho. Diana Ramos concluiu com uma nota de esperança: este adeus não é definitivo — há vontade de continuar esta reflexão no próximo ano.
Seguiu-se a intervenção de Romain Trevisan, CEO do grupo Cultural Affairs, que engloba diversas entidades ligadas à arte e à cultura contemporânea, como o Vhils Studio, a Underdogs Gallery, o Festival Iminente, a plataforma phygital Eterno e a Clay, dedicada à arte em azulejos. No seu pitch, Trevisan destacou a importância da criatividade e da internacionalização: "Tudo começa com o talento. De Portugal para o mundo, tentamos atingir o máximo de público. A minha principal missão é construir a marca e apoiar a criatividade dos artistas."
O primeiro painel da tarde, intitulado "Como é que as marcas de luxo se podem adaptar às diferentes gerações?", foi moderado por Rosário Mello e Castro, diretora da Máxima e responsável editorial da Must. Contou com a participação de Eduardo Martins, Brand Specialist da The Macallan Portugal; Inês Baptista da Câmara, CEO do Studio Astolfi; e Nuno Saraiva, General Manager da L’Oréal Luxe. A conversa desenvolveu-se em três momentos distintos: o estado atual das marcas, os desafios da sustentabilidade e as perspetivas para o futuro.
Nuno Saraiva salientou que, apesar de um contexto otimista, "há muita incerteza no mercado do luxo, há muita coisa que nos deixa com dúvidas sobre o futuro." Na vertente da sustentabilidade, Eduardo Martins destacou que "95% da energia usada na destilaria da Macallan provém de fontes sustentáveis", referindo ainda o sistema de reaproveitamento da água que permite o seu regresso ao rio sem prejuízo para o ecossistema local. Por sua vez, Inês Baptista da Câmara enfatizou a importância da valorização artística e identitária: "É preciso reforçar a linguagem artística — as novas gerações querem conhecer os designers portugueses."
Depois, subiu ao palco Constança Entrudo, jovem designer portuguesa reconhecida pela abordagem inovadora e sustentável. Trouxe uma reflexão relevante sobre a descentralização da indústria da moda, defendendo que Portugal tem potencial para ser não apenas um centro de produção, como também de criação e inovação: "O meu projeto cresceu desta vontade de explorar a relação entre fábricas — grandes ou pequenas — e o designer."
Após uma breve pausa, seguiu-se o painel "O impacto do luxo no real estate", moderado por Diana Ramos. Participaram António Ribeiro da Cunha (CEO da Mello RDC), Carlos Leal (General Manager da United Investments Portugal), Helena Amaral Neto (Managing Partner da LUXULTING) e Nuno Durão (Sócio-Gerente da Fine & Country Portugal). A discussão começou com uma reflexão de Nuno Durão sobre a evolução do mercado: "Portugal entrou verdadeiramente no mercado internacional em 2012/13. Hoje, já não cabe numa mão o número de personalidades internacionais a viver no nosso país."
Pelas 17h35, foi a vez de António Paraíso, consultor e especialista em marketing, luxo e inovação, apresentar o seu pitch. Focou-se nos três grandes desafios que o setor do luxo enfrenta atualmente: transformação digital, sustentabilidade e democratização do luxo — ou, como referiu, "a banalização do luxo".
O último painel do dia, "Como levar o luxo português para o mundo?", foi moderado por Marisa Caetano Antunes, jornalista do NOW. Reuniu um conjunto diversificado de vozes da indústria: Américo Pinheiro (CEO da Ferreira de Sá), Claire Chung (CEO da Ignae), Maria João Bahia (designer de joias), Margarida Correia (CEO da Amorim Fashion) e Nuno Barra (diretor de marketing e inovação da Vista Alegre). Foram partilhadas experiências concretas sobre os desafios da internacionalização. Maria João Bahia referiu que parcerias locais têm facilitado a entrada em mercados como Gstaad e Cannes, onde já expõe peças da sua marca. Nuno Barra, por sua vez, sublinhou a dificuldade em afirmar uma marca portuguesa num mercado global altamente competitivo.
Um dos momentos mais aguardados foi a conversa entre Mónica Seabra-Mendes, diretora do programa de Gestão de Luxo da Universidade Católica, e o filósofo francês Gilles Lipovetsky, conhecido pela sua análise da hipermodernidade. Lipovetsky recordou a polémica que gerou quando publicou Os Tempos Hipermodernos, um livro que, na altura, escandalizou parte da academia por um filósofo se debruçar sobre a moda: "Foi muito difícil encontrar fontes e bibliografia sobre o tema. (...) Mas o mundo da moda acolheu o livro com entusiasmo."
Para encerrar a conferência, Jorge Leitão, presidente da associação Laurel e CEO da histórica joalharia Leitão & Irmão, destacou a importância da ECCIA – European Cultural and Creative Industries Alliance, uma aliança europeia que reúne marcas de excelência e tem como missão reforçar o papel do luxo enquanto vetor económico e cultural.
O ciclo de conferências promovido pelo Jornal de Negócios e pela Must deixou claro que o luxo, quando bem trabalhado, é mais do que um símbolo de status: é um motor económico. Como referiu Diana Ramos, "o setor do luxo é dinamizador de empregos, cria marcas globais, serve de alavanca às exportações e atrai investimento estrangeiro". Já Rosário Mello e Castro relembrou que, apesar dos desafios, o futuro do luxo português está repleto de oportunidades criativas. Portugal pode ter acordado tarde para esta indústria, mas está agora mais desperto do que nunca.