Rodolfo Lohrmann. A história do argentino assassino de filhos de governantes que Portugal deixou escapar
"El Ruso", como era conhecido este criminoso violento nascido na Argentina, estava preso por assalto a bancos e joalharias, mas no seu país de origem sequestrava jovens de famílias ricas, exigia resgates e, por vezes, assassinava-os mesmo depois de ter recebido o dinheiro. Fugiu da cadeia e está a monte.
Se o leitor tiver cerca de 40 anos, talvez se lembre de uma fuga da cadeia, em meados dos anos 90, se não nos falha a memória, em que se dizia – verdade ou mito urbano – que a mania dos automobilistas portugueses de fazerem sinais de luzes uns aos outros quando a polícia está por perto – para avisar que convém moderar a velocidade ou pôr o cinto de segurança para evitar multas –, fez com que tivesse levado muito mais tempo do que o expectável a apanhar os foragidos. E se for um pouco mais velho, talvez se recorde da famosa fuga dos 89 pides, a 29 de junho de 1975, imortalizada na música O Fado de Alcoentre, de autoria de Fernando Tordo. A cadeia de Alcoentre é também conhecida como Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus e, este sábado, voltou a ser palco de uma fuga. Desta vez, não foram 89, mas apenas cinco. Um deles, o mais perigoso, chama-se Rodolfo Lohrmann, tem 61 anos, é conhecido como "El Ruso" e já foi um dos criminosos mais procurados na Argentina. Aqui foi preso por assaltos a bancos e joalharias, mas no seu país de origem sequestrava e assassinava filhos de governantes, mesmo quando estes pagavam o resgate. Estava preso há oito anos e tinha mais 10 anos para cumprir.
Com Lohrmann, no que toca a assaltos, rapidez e eficiência era o nome do jogo. Existem imagens de circuito interno que mostram o argentino a assaltar uma agência do banco Millennium bcp. Chega no momento em que duas funcionárias contavam o dinheiro e, em poucos minutos, sai de lá com 50 mil euros. Assaltos como este foram, pelo menos, cinco entre 2014 e 2016. Mas pior foi o que fez na Argentina, onde ganhou notoriedade por sequestrar jovens de famílias ricas que libertaria a troco de resgate – que, a par do narcotráfico é, provavelmente, o crime mais típico da América do Sul. Só que, muitas vezes, a liberdade não chegava nem a troco de dinheiro.
Cristian Schaerer, filho de um ex-ministro da Saúde argentino, tinha 21 anos quando foi, alegadamente, vítima de sequestro. O pai pagou o equivalente a mais de 200 mil euros de resgate, mas Cristian nunca chegou a aparecer – está desaparecido desde setembro de 2003. Ao jornal argentino Clarín, Pompeya Goméz, mãe de Cristian disse que "não consegue parar de chorar" desde que soube da fuga. Tinha esperança de que, cumprida a pena em Portugal, o regresso de Lohrmann à Argentina lhe permitisse descobrir o paradeiro do filho. Agora essa esperança desapareceu.
A filha do antigo presidente do Paraguai, Raúl Cubas Grau, terá sido outra vítima. Foi raptada e, alguns dias depois, o corpo foi encontrado numa fossa perto da fronteira com a Argentina.
Não é, portanto, por acaso que durante a conferência de imprensa sobre a fuga, o diretor nacional da Polícia Judiciária, Luís Neves, tenha alertado a população para o facto de estarmos perante "criminosos perigosos e violentos" que farão "tudo" para se manterem em liberdade e que são uma ameaça "à vida humana". Se alguém os avistar não deverá interagir com eles, mas contactar o 112 de imediato.
Numa entrevista à SIC Notícias, Frederico Morais, do Sindicato do Corpo da Guarda Prisional, contou que foi com perplexidade e inquietação que recebeu a informação de que Lohrmann não era um simples assaltante de bancos: "Quando fomos informados, no sistema interno da Interpol, que tínhamos em Portugal os dois homens mais procurados da Argentina, foi um bocadinho assustador, porque estavam a ser tratados no sistema prisional como dois presos normais que tinham cometido um assalto a um banco na zona oeste de Portugal".
Foi muito por conta desta informação que El Ruso foi encarcerado no Estabelecimento Prisional de Monsanto, a mais segura prisão do país, onde cumpriu sete dos 18 anos e 10 meses de prisão a que foi condenado. No entanto, já este ano foi transferido para Vale de Judeus, por decisão do Tribunal de Execução de Penas, apesar do parecer contrário da Direcção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, que alertava para o sério perigo de evasão deste homem. De resto, Rodolfo Lohrmann chegou a tentar fugir de Monsanto, mas falhou. Na conferência de imprensa, o diretor-geral dos serviços prisionais, Rui Abrunhosa Gonçalves, lançou uma sentença lapidar: "Se estivesse em Monsanto, não teria fugido".
De Vale de Judeus, fugiu mesmo. Ele e mais quatro. Todos criminosos perigosos – dos cinco evadidos, de acordo com Luís Neves, só ao georgiano Shergili Farjiani não é reconhecido um elevado grau de violência –, todos colocados no mesmo bloco. "Saíram das celas para o pátio e depois, com uma escada que estaria escondida no exterior, escalaram o muro de seis metros de altura e escaparam", contou ao jornal Expresso um elemento do Corpo da Guarda Prisional. A evasão terá tido o auxílio de "três indivíduos que aguardavam no exterior", revelou ainda ao jornal fonte ligada às buscas. Uma operação que o diretor nacional da PJ descreveu como "complexa, [um] crime organizado com capacidade financeira". Nas 20 horas que levava já a investigação ao momento em que foi feita a conferência de imprensa, Luís Neves disse que foi possível detetar que "todos os pormenores foram pensados ao mais ínfimo detalhe". São "gente muito bem preparada", disse.
Certo é que, de acordo com as imagens das câmaras de vigilância da cadeia, fugiram às 9h56, de forma mais ou menos tranquila e ordeira. Quase todos de fato de treino, mas um, pelo menos, com uma capa de camuflado de combate, que seria, certamente, interessante descobrir como lhe terá chegado às mãos. O alerta foi dado 40 minutos depois. A escolha do dia e da hora não foi aleatória: sábado é dos dias em que há menos guardas prisionais – estavam 33 ao serviço e, durante a conferência de imprensa foi dito que esse número estava dentro do limite aceitável – e à hora das visitas, quando os guardas têm mais tarefas em mãos e estão, por isso, mais dispersos. Para além de Lohrmann, o grupo incluia os portugueses Fernando Ferreira e Fábio Loureiro, de 63 e 34 anos, repetivamente, o georgiano Shergili Farjiani, de 42 anos, e o britânico Mark Roscaleer, de 37 anos. A equipa que está a investigar a fuga acredita que os homens se separaram assim que saíram da prisão.
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