Viver

O luxo da simplicidade por Juliana Cavalcanti

Trabalhou com branding, passou pela moda e encontrou-se no design de interiores. Apaixonou-se por Lisboa há 18 anos e por aqui ficou. Hoje, é uma das mentes criativas que estão a transformar a identidade visual de uma capital de portas abertas para o mundo.

Juliana Cavalcanti, designer de interiores em Lisboa, renova identidades visuais
Juliana Cavalcanti, designer de interiores em Lisboa, renova identidades visuais Foto: Luís Fonseca
23 de dezembro de 2025 | Maria Salgueiro

Juliana Cavalcanti não usa maquilhagem, nem perfume. Os tons neutros com que se veste são os mesmos que forram os seus sofás. que decoram as suas estantes. Para a brasileira de 42 anos o natural é a Estrela Polar que guia uma vida levada com leveza, abrindo caminho às oportunidades que só se dão a quem não planeia em demasia. Foi assim que começou a trabalhar em design de interiores e foi assim que o Studio Cavalcanti assumiu a direção criativa da Casa Reia, No Convento e Black Trumpet, projetos do coletivo Reia Collective que estiveram na linha da frente de uma nova era da hospitalidade lisboeta, mas também das casas de quem, tal como ela, nos últimos anos resolveu se fixar por cá.

Antes de o quiet luxury ser tendência, a Juliana já era um símbolo desta estética. Essa sofisticação é-lhe característica?

Fico muito lisonjeada que pensem isso e, quando mo dizem, fico curiosa para entender o porquê. É-me tão natural que não é planeado, não é de propósito. Sou muito esteta desde que nasci, mas tenho uma estética própria que sempre foi parecida. Houve uma leve evolução com o tempo: quanto mais madura, mais velha, talvez mais conservadora me fui tornando. Gosto das coisas bonitas, mas sou zero perfecionista. Sou muito relaxada. Aquilo de que gosto mesmo é que pareça não existir muito esforço em lugar nenhum - nem nos projetos que faço, nem em mim. Gosto do natural e acho que é mais agradável, tanto numa casa quanto na forma de estar, de ser, de vestir.

Juliana Cavalcanti, designer de interiores, apaixonada por Lisboa, transforma a identidade visual da capital
Juliana Cavalcanti, designer de interiores, apaixonada por Lisboa, transforma a identidade visual da capital Foto: Luís Fonseca

Além do design de interiores, também já se aventurou na moda. Chegou a ter uma marca de roupa.

Formei-me em Moda em São Paulo e trabalhei em moda durante 14 anos, em branding, marketing e direção criativa. Ajudei várias marcas a refazerem a sua linguagem visual. Mais tarde, criei a minha marca de roupa, Juu. Um processo muito interessante porque fiz tudo sozinha. Recebi um feedback incrível, mas, depois de o meu sócio e investidor ter tido de se afastar do projeto, não tive estofo financeiro para continuar. Estava um pouco desgostosa da moda, para ser sincera. Estava mais velha, o que alterou o amor por uma área que para mim, começou a ficar superficial e efémera demais. Na altura, o destino trouxe-me para o design de interiores. Estava a fazer direção criativa de uma sessão de moda num hotel e o dono pediu-me para fazer consultoria para eles, para mudar toda a estética, linguagem visual e marketing do hotel. Era o que eu fazia em moda, mas numa área nova. Adorei. Foi aí que percebi que o design de interiores era muito mais rico e interessante do que a moda, e comecei a aproximar-me do universo da hotelaria.

Os seus projetos tornaram-se sinónimo desta nova vaga de uma Lisboa virada para um público mais internacional. O que acha que estes empresários viram em si para se entregarem nas suas mãos?

Cada vez mais, existe na cidade uma oferta internacional em termos estéticos. Mas, quando a Casa Reia estava a ser criada, ainda faltava um pouco isso. Eu tinha uma linguagem visual que ia muito ao encontro da estética deles. Conhecíamo-nos e eles sabiam que os nossos gostos estavam alinhados. Quando começámos a falar sobre o projeto, eles queriam uma linguagem um pouco mais étnica - e eu tinha muito claro na minha cabeça que não queria mais um espaço étnico. Bali na Caparica, sabe? Começamos a conversar, preparei um moodboard e perguntei: "Que tal uma linguagem um pouco mais sofisticada, mas sem estar fora do contexto de praia?" E eles abraçaram isso.

Juliana Cavalcanti, designer de interiores em Lisboa, partilha a sua visão de luxo e simplicidade
Juliana Cavalcanti, designer de interiores em Lisboa, partilha a sua visão de luxo e simplicidade Foto: Luís Fonseca

A decoração da Juliana tem simplicidade, mas, ao mesmo tempo, os espaços transmitem calor, são aconchegantes. Como é que se consegue fazer isso?

A estética escandinava, minimalista, é um pouco fria, apesar de ser simples, porque os elementos não têm grande estrutura ou volume. Nós gostamos de reunir peças bulky, com mais volume, com mais presença. Usamos bastantes tecidos, estofados, muita madeira. A escolha dos materiais é muito importante. Adoramos pedra natural e as cores são muito importantes também - nunca vamos para um cinza. Costumamos escolher tons mais quentes, um creme ou um verde. A junção de tudo isso, cor, forma, textura, materiais, faz com que o conjunto fique mais quente, caloroso, aconchegante, convidativo.

A sua estética parece transcender as várias áreas da vida - a forma como se veste, por exemplo, combina com os espaços que decora. Acha que o processo de amadurecimento consolida a forma como nos apresentamos ao mundo?

Sem dúvida nenhuma. Imprimo no trabalho aquilo que me é inato na vida, na forma de estar, de vestir e de criar ambientes. Para se viver numa casa, uma das coisas mais importantes é o conforto. Não queremos trocar de mobília a cada dois anos, porque é demasiado trendy e enjoa. Para o nosso estúdio, faz sentido que o resultado seja o mais aconchegante e duradouro no tempo possível. E a beleza, para mim, está na intemporalidade.

Juliana Cavalcanti, designer de interiores, reside em Lisboa e renova a identidade visual da capital
Juliana Cavalcanti, designer de interiores, reside em Lisboa e renova a identidade visual da capital Foto: Luís Fonseca

O que a fez querer mudar-se para Lisboa há 18 anos?

Foi o destino. Nunca planeei viver em Lisboa. Vim visitar uma amiga a caminho de Milão, onde ia fazer um mestrado de Moda, área em que já trabalhava no Brasil. Larguei o trabalho, pedi demissão e vim para a Europa. Era muito nova, estava a começar a minha carreira, tinha a vida pela frente e nada me prendia. Gostei logo de Portugal... Nunca consegui explicar, porque não é racional. Lisboa era outra cidade naquela época, mas mesmo aí senti-me muito em casa, deu-me uma sensação de acolhimento, fui bem recebida. Fiz amigos muito rapidamente e isso fez com que amasse tanto estar aqui que pensei: porque é que hei de ir para Milão? Não quero recomeçar. Fiquei em Lisboa e acabei por nem fazer esse mestrado.

De que forma é que as mudanças nos moldam?

A 100%. Apesar de ser capricorniana - os capricornianos são muito racionais -, eu meio que deixo a vida me levar. Não planeio muito. As minhas mudanças sempre aconteceram porque as senti. As mudanças, as oportunidades, as viagens, o conhecimento cultural, não ter medo do desconhecido, tudo isso nos faz crescer e expandir. Em cada fase da minha vida, entendi um pouco melhor quem era e quem viria a ser. Mudamos muito dos 20 para os 30, para os 40. Fiz muitas mudanças: vim, voltei, mudei de casa, mudei de trabalho. la sentindo, pensando: estou feliz aqui? Se estivesse ficava, se não, mudava. A mulher que sou hoje tem muito de todos esses mundos que vivi. E fico feliz, porque isso significa que agora, que é fase de criar família com o meu marido, com a minha filha, com a nossa casa, sou muito mais sólida. Não me arrependo de nada. Quando vivemos muitas coisas, sabemos quando chegamos ao sítio certo. Agora estou bem aqui.

Créditos: Maquilhagem e Cabelo de Elodie Fiuza.

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