“The Passing Vessel”. O workshop imersivo no Porto que ensina a criar velas perfumadas
Uma inundação levou a marca artesanal de luxo, Sneferu, inspirada no faraó homónimo e no antigo Egito, a mudar-se para uma nova casa. Fica no Bonfim.
À medida que o relógio se aproxima das 16h00, diferentes sotaques começam a ecoar no interior do atelier da Sneferu, uma empresa portuguesa de velas perfumadas de luxo e cerâmica fina. Pertencem aos participantes de mais uma edição do “The Passing Vessel”, um workshop imersivo e inovador que desafia os presentes a calçar as luvas, vestir o avental e aprender todos os segredos para criar uma fragrância personalizada.

Enquanto Or Edery e Tiago Santos, os anfitriões, terminam os preparativos para o arrancar da experiência, os 10 elementos que a vão integrar deixam-se vencer pela curiosidade e partem à descoberta do espaço calmo e cheio de luz que, desde janeiro, atrai a atenção de quem passa pelo número 49 da rua de Ferreira Cardoso, no Porto. Das largas e compridas mesas de trabalho, pelas quais se espalham os kits individuais indispensáveis para a realização da oficina, aos artefactos que preenchem as estantes com várias cores e feitios, há muito para ver e cheirar por aqui. O jardim privado, onde os visitantes são convidados a beber um copo e refrescarem-se antes do início da atividade, é outro dos atrativos do estúdio, com dois fornos grandes e uma série de tintas e ferramentas à espera de serem utilizados pelas mentes criativas que o frequentam.

“Numa primeira fase, este era apenas um local de produção, exposição e venda dos nossos produtos. Com o tempo, achámos que fazia sentido desenvolver um ritual que celebrasse a cerâmica, a perfumaria, as velas e as pessoas, isto é, tudo aquilo que nos representa. Pareceu-nos a melhor forma de dar o projeto a conhecer, com profundidade, ao público”, conta Tiago, que se dedica, maioritariamente, à parte comercial e de comunicação da marca.
“Como não queríamos oferecer um workshop como tantos já disponíveis, em que é necessário esperar semanas para receber o objeto final, pois este precisa secar e cozer antes de ser possível decorá-lo, criámos o ‘The Passing Vessel’. Assim, através de uma espécie de passagem de testemunho, conseguimos que ninguém vá para casa de mãos a abanar ou conformado por não poder regressar para concluir a sua obra, seja por serem turistas e estarem de partida ou por qualquer outro motivo”, acrescenta.

A experiência arranca com o participante a escolher o vaso, vidrado por alguém — que deixa um bilhete com o nome e uma curiosidade sobre si — numa sessão anterior. Quando todos tiverem elegido o recipiente em que vão colocar a vela, passam para a bancada. É à volta desta que os especialistas esclarecem conceitos básicos da ciência em torno da arte da perfumaria e apresentam os aromas que podem usar. Estes dividem-se em quatro famílias: gourmand (avelã, café, chocolate), floral (jasmim, pinheiro, lavanda), oriental (açafrão, cardamomo, cravinho) e frutada (limão, laranja, morango).

“Importa entender que cada nota tem características próprias, razão pela qual encaixam em categorias distintas. Juntas dão forma à chamada pirâmide olfativa, o conceito em que assenta o fabrico de perfumes. As de topo são as que sentimos ao aplicar o produto e as responsáveis por causar a primeira impressão que temos dele. Por serem leves e voláteis, acabam por evaporar rapidamente. É nessa altura que surgem as de corpo [ou coração]. Mais pesadas e memoráveis, definem a identidade da mistura. Os cheiros de longa duração, que se adaptam à pele em que assentam, são considerados de fundo ou base. Demoram a ser percebidos, mas permanecem durante um maior período. Apesar de usarmos esta estrutura para explicar a química envolvida, a mesma não se aplica às velas. O motivo é simples. Embora também contenham moléculas de diferentes pesos na sua composição, a vela queima toda à mesma temperatura. Logo, as notas são libertadas em simultâneo”, clarifica Tiago.
Com isto em mente, os artesãos por um dia podem optar por um odor ou mesclar vários nos papéis de teste, até chegarem à combinação que pretendem integrar numa cera 100% natural. Depois, com a ajuda dos hosts, que ensinam a colocar o pavio e a calcular as proporções para um melhor resultado, vertem a vela no recipiente previamente selecionado. Enquanto o material solidifica, é momento de petiscar, beber uns copos e conviver no jardim. Segundo a dupla — capaz de realizar a atividade em português, inglês, espanhol, italiano e hebreu —, como têm quase sempre pessoas de distintas nacionalidades, idades e profissões a participar, acaba por haver uma troca de ideias e perspetivas muito interessante.

A oficina semanal, com duração de duas horas e meia, playlist personalizada e um custo de 45 euros, termina com todos a decorar as peças e a escrever os bilhetes que vão ficar disponíveis para os membros dos próximos grupos.
Uma história de resiliência inspirada no antigo Egito
Os pais de Or Edery são naturais de Marrocos. Contudo, quando a situação se complicou para a comunidade judaica no país africano, fugiram para Israel, onde nasceu. Foi aí que, ainda criança, surgiu o gosto pelos trabalhos manuais, de um modo geral, e pela cerâmica, em particular. Durante bastante tempo, esses interesses não passaram de hobbies. As coisas alteraram-se ao fim de imensos anos a viver em Londres, cidade em que esteve ligado à indústria tecnológica. Entre os trabalhos mais marcantes, Edery conta a criação de uma startup voltada para a deteção de fraude online. Após mais de uma década dedicada a esta área, resolveu mudar de vida e explorar o seu lado artístico. Fez então as malas e mudou-se para Portugal, tendo obtido a cidadania com maior facilidade por ser judeu sefardita, ou seja, descendente de judeus que moraram na Península Ibérica até serem perseguidos e expulsos pela Inquisição.
“Aquilo que fazia já não me apaixonava como no princípio. Estava cada vez menos motivado e sentia que precisava de fazer algo diferente. Vim para Portugal à procura de inspiração e acabei por encontrá-la no Porto. Fiquei encantado com a cidade e com a forma como me recebeu. Foi como se chegasse a casa. Além disso, tem uma comunidade artística muito interessante e diversa, além de bem representada quando o assunto é cerâmica. Quis fazer parte dela. Para isso, abracei a minha faceta criativa e abri a Sneferu, que me permite contactar diariamente com a arte e a beleza. Tudo é feito à mão, com significado, propósito e o máximo de qualidade possível. Agrada-me a ideia de produzir objetos que, apesar de não serem considerados indispensáveis à vida, conseguem, com o seu charme e graça, dar-lhe outro significado”, partilha Or, fundador e diretor criativo.
Como o nome deixa antever, a empresa é inspirada no faraó homónimo. “É uma figura histórica extremamente importante, mas sobre a qual quase não há registos, visto pertencer a uma das primeiras dinastias do Egito. Numa época em que as pirâmides eram edificadas em patamares, Sneferu, movido pelo seu gosto pela arquitetura e geometria, bem como pelo seu desejo de alcançar a perfeição, queria construir uma pirâmide de faces lisas. Foi o primeiro a consegui-lo. Já os filhos dele são os responsáveis pelas famosas pirâmides de Giza”, relata Tiago, companheiro de Or.
Como o faraó, a empresa fundada pelo israelita segue a filosofia das sete virtudes da deusa Maat: verdade, equilíbrio, ordem, justiça, lei, moralidade e harmonia. Todas serviram de base para a criação das sete fragrâncias que tornam únicos os produtos comercializados pela dupla.
Nove passos até à perfeição
Do moldar da argila até ao verter da cera, quase tudo é feito no atelier do Bonfim, para o qual se mudaram no início do ano, depois de uma inundação ter inutilizado a casa em que estavam desde a abertura, em 2023. Com uma equipa multicultural, composta por pessoas de países tão distintos quanto o Brasil e a Lituânia, delinearam um procedimento de nove passos.
A moldagem, por exemplo, está a cargo de Anabela, que desenha e constrói os moldes de gesso. Segue-se a preparação da argila, feita com um agitador de alta rotação. Nesta fase, a água é adicionada até o material obter a densidade e viscosidade necessárias para verter nos moldes. Antes de serem acabadas à mão, de maneira a eliminar quaisquer imperfeições, as peças ficam a secar durante vários dias. Posteriormente, vão ao forno pela primeira vez, onde são cozidas a 1000°C. Esta etapa permite acrescentar a resistência mecânica e porosidade necessárias para a vitrificação, que utiliza esmaltes feitos à medida e pintura à mão para obter o melhor brilho e tom possíveis. Aplicados os esmaltes, as peças voltam ao forno a 1280°C, transformando-se em porcelana num processo com cerca de 30 horas. Quando a produção inclui decalques ou aplicação de lustros, pode ser necessário ir ao forno por mais duas horas. Cada artefacto é, então, selecionado de acordo com altos padrões de qualidade. Segue-se a preparação da cera — de abelha africana ou resultado de uma mistura de soja, coco e colza —, com óleos de perfume criados por Ilias Kakis, um mestre perfumista a viver no Reino Unido. As fragrâncias são as únicas produzidas fora do estúdio portuense, mas com indicações da equipa que o compõe. Em seguida, a fusão de cera e perfume é derretida e vertida lentamente para os vasos de porcelana, garantindo superfícies suaves e uniformes. Por fim, as velas passam por um processo de cura de uma semana. Uma vez queimadas, o cliente fica com peças decorativas elegantes.

Onde? Rua de Ferreira Cardoso, 49 (Porto). Horário? Segunda, das 14h00 às 20h00. Terça, quinta e sexta, das 11h00 às 19h00. Quarta, das 11h00 às 19h30. Sábado, das 14h00 às 19h00. Reservas? 91 177 3343.
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