Prazeres / Artes

Novo mural de Banksy em Marselha

A obra recentemente descoberta é a primeira depois de um interregno de mais de cinco meses. Num artigo para a BBC, Kelly Grovier, especialista no trabalho do famoso grafitter, tenta explicar o significado deste farol.

Foto: Getty Images
11 de junho de 2025 | Madalena Haderer
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Banksy está de volta. Há pouco mais de uma semana, publicou, nas redes sociais, fotos do seu novo mural acabado de pintar. Quase sem pestanejar e sustendo a respiração, assim, como quem espera pelos números da lotaria, os britânicos saíram à rua e olharam para as suas fachadas, na esperança de serem os proprietários da nova peça de arte urbana do mais famoso (e mais rentável) grafitter de todos os tempos. Afinal, tendo em conta os valores astronómicos que as obras de Banksy têm atingido em leilões, o feliz contemplado podia telefonar de imediato ao patrão, a despedir-se. Tiveram azar. Desta vez, Banksy "atacou" em França, mais concretamente, em Marselha, com um pequeno farol pintado com o seu inconfundível estilo stencil, atravessado pela frase "Quero ser aquilo que vês em mim", e com uma sombra que percorre o passeio até à base de um pilar metálico, criando a ilusão de que a pintura na parede é apenas uma sombra.

Foto: Getty Images

É bem conhecido o hábito de Banksy de passar mensagens nas suas obras. Há sempre uma componente de sátira e crítica social nos seus trabalhos. O desânimo existencial e o descrédito na humanidade são aparentes, mas há também um certo romantismo na sua obra – e, muito lá no fundo, como na caixa de Pandora, parece haver esperança. Assim sendo, que mensagem terá querido passar desta vez? Quem são o "eu" e o "tu" desta frase? Sendo que Marselha é uma cidade com muita imigração, em particular oriunda de países do Magrebe, será este farol uma crítica às políticas e ao sentimento anti-imigração que se tem vindo a difundir pela Europa? Estará Banksy a criticar a França, e o mundo ocidental no geral, por ser um falso farol de liberdade e tolerância? Mas, quererá mesmo a Europa ser aquilo que os imigrantes vêem nela? Ou será que é o próprio artista que gostaria, enquanto europeu, que a sua terra fosse aquilo que quem está de fora acredita que ela é?

Ou, será que não tem nada a ver com imigração? Será que o objectivo de Banksy foi passar uma mensagem mais transversal, sobre a experiência humana do amor? Sobre a experiência de se estar apaixonado por alguém e de nós próprios nos apaixonamos pela ideia que a pessoa que amamos tem de nós, e que sabemos estar longe da realidade? Estará o artista a referir-se a esse desejo de percorrer a distância entre quem somos na verdade, e quem somos para quem se apaixonou por nós?

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Foto: Getty Images

Tudo boas perguntas para as quais esta jornalista não tem resposta. A BBC, porém, decidiu fazê-las a alguém mais credenciado: Kelly Grovier, autora do livro How Banksy Saved Art History, sem edição portuguesa. Refletindo sobre esta obra – a primeira depois de um interregno de mais de cinco meses –, a autora encontra uma mensagem existencial: "Qual é o nosso verdadeiro eu, a pessoa que somos ou aquela que podemos tornar-nos? Um questionamento de monta com o qual não esperamos ser confrontados enquanto passeamos por Marselha, numa tarde de fim de maio." Acrescentando que "por detrás dos seus stencils furtivos, esconde-se também um envolvimento profundo e deliberado com a história das ideias, desde o estoicismo clássico até ao desconstrucionismo pós-moderno." 

Mais à frente, Kelly Grovier diz ainda o seguinte: "Qualquer pessoa interessada em descobrir a origem das ideias que inspiram a nova obra de Banksy precisa apenas de abrir qualquer manual de história da filosofia sobre a célebre alegoria da caverna de Platão (do tratado A República, do século IV a.C.) – e depois inverter a antiga metáfora. Na parábola de Platão, prisioneiros acorrentados dentro de uma caverna confundem sombras projetadas na parede com a realidade, sem saber que, no exterior, existem formas mais verdadeiras que lhes dão origem. Mas aqui, Banksy, sendo Banksy, troca-nos as voltas ao inverter a estrutura da história, subvertendo a relação entre essência e sombra. No mural de Banksy, o modesto pilar não projeta uma versão diminuída de si mesmo, mas sim algo muito mais grandioso – um farol, símbolo de iluminação e orientação. Aqui, é a silhueta, e não a realidade, que representa a verdade."

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