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Escapar à pandemia: por dentro do novo refúgio das elites financeiras dos EUA

A apenas 45km da costa de Los Angeles, um antigo enclave hippie alberga agora titãs das finanças que se protegem da Covid-19 e que compraram casas ao lado de nomes como Leonardo diCaprio, Mel Gibson ou Beyoncé.

Malibu, Califórnia, EUA
Malibu, Califórnia, EUA
29 de janeiro de 2021

Malibu sempre foi uma cidade que atraiu turistas, designers e almas criativas de todos os segmentos. Apesar das celebridades que ali residem, a energia que antes pairava era a de um suavizado "hippie chic" (inspiração nos trajes da contracultura hippie, mas com um toque mais refinado). Mas isso foi até a Covid-19 seduzir uma nova vaga de ricos que procuram temperaturas amenas e o bucólico estilo de vida dos surfistas. Agora, quase todas as casas estão arrendadas (a valores que vão até aos 200.000 dólares por mês) e os proprietários que antes só lá iam no verão decidiram mudar-se de "armas e bagagens".

As propriedades mais procuradas variam desde as paredes caiadas de branco com telhados repletos de telhas vermelhas, num revivalismo dos imóveis espanhóis, até obras de arte modernistas como a Stevens House do arquiteto John Lautner (que foi comprada em 2017 pelo ator Edward Norton), passando pelas casas rústicas hippie de consciencialização ecológica como a que a atriz Daryl Hannah vendeu ao seu ex-namorado Neil Young.

Os mediadores imobiliários locais dizem que Malibu está a viver um dos melhores momentos de expansão imobiliária dos últimos anos. Sara Grisanti, corretora de imóveis e mulher de Paul Grisanti, o presidente da câmara de Malibu, notou um forte aumento de inquilinos provenientes da costa leste desde o início da pandemia. "Senti como se fosse uma evacuação. Não conseguia arranjar casas suficientemente depressa para atender à procura. Sobraram poucos imóveis no mercado do arrendamento", diz. E se estiver à procura de casa para comprar, pense duas vezes: as casas nas falésias rondam os 100 milhões de dólares.

Como é que esta pequena cidade, outrora descrita por Ron Herman – fundador (e sobrinho do gigante do retalho Fred Segal) do espaçoso centro de compras Malibu Country Mar – como "uma autoestrada e três pequenos centros comerciais" se tornou um retiro de eleição para os super ricos?

O surf e as praias conferem parte do encanto. Quem se recorda de Keanu Reeves no filme Ruptura Explosiva ainda consegue visualizar aquelas águas de um azul cristalino e o perfeito encanto das ondas tubulares. E está acessível a apenas 35 minutos de carro do centro de Los Angeles: mesmo a Carbon Beach de Malibu, praia conhecida como Billionaire’s Beach, está agora aberta ao público em geral – e quem quer que seja corajoso o suficiente para enfrentar a ondulação do Pacífico pode fazer surf com remos para apanhar uma onda.

Já muito tempo passou desde que os pioneiros May e Frederick Rindge compraram, no século XIX, o Rancho Malibu, com uma extensão de 44 quilómetros, e montaram uma feroz campanha para impedir que as estradas públicas e a ferrovia ali passassem. Quando Frederick Rindge morreu, em 1905, May prosseguiu a luta. Ela conseguiu pagar os custos jurídicos ao arrendar a propriedade com vista para o oceano a estrelas de Hollywood como Barbara Stanwyck e Gloria Swanson, que construíram casas rústicas ao longo da praia privada com 1,5 km que veio a ser conhecida como Malibu Colony. 

A privacidade sempre foi uma característica intrínseca da estrutura de Malibu, o que lhe confere um óbvio encanto para as celebridades que tentam fugir da atenção dos paparazzi. Leonardo diCaprio, Kylie Jenner, Mel Gibson, Jeffrey Katzenberg e Beyoncé são apenas alguns dos que ali compraram casa. É perfeitamente normal ver estrelas como Dustin Hoffman a trocar umas piadas com quem ali passa, ou ver Nick Nolte, por exemplo, a ir com um roupão felpudo à mercearia local, a Ralphs.

Segundo a W magazine, "o Nobu [restaurante japonês] é a bolha pandémica das celebridades", onde uma força centrífuga parece atrair um contínuo fluxo de rostos famosos, e mesmo por altura do pico da Covid-19 pudemos ver muita gente, desde os Kardashian-Jenners até Kaia Gerber, passando por Jaden Smith, a pararem por lá para comerem sushi e lançarem uns beijos para o ar.

E não são os únicos que procuram atenção em Malibu. "Não é invulgar encontrarmos alguém no supermercado a usar um bikini fio dental", diz Neda Sodrerqvist, instrutora de celebridades que cria exercícios cardio de alto impacto para Lady Gaga, Minnie Driver e Larry Ellison no seu estúdio no Serra Retreat, um enclave nas colinas do Malibu Canyon.

Embora se possa encontrar por lá muitas celebridades, os habitantes locais tendem a dar-lhes algum espaço. Eles sabem que as estrelas de cinema compõem a experiência de visitar Malibu e veem-nas em grande medida como veem os gloriosos pores-do-sol na Point Dune Beach: o glamoroso pano de fundo do dia a dia.

E se os paparazzi se tentam infiltrar, os locais unem-se em defesa das celebridades. Dorothy Lucey, ex-repórter televisiva da Fox Entertainment e que vive em Malibu há mais de 30 anos, recorda uma altura em que Pamela Anderson (cujos filhos andavam na mesma escola que os dela) foi perseguida por um fotógrafo que andava com uma prancha de surf para disfarçar. Ela e mais alguns dos pais que ali estavam chamaram os seguranças da praia, que foram atrás do paparazzo e o obrigaram a correr pela areia, deixando para trás a prancha de surf e a máquina fotográfica.

"Sempre me senti como se vivesse numa pequena cidade. Mesmo com os incêndios [que fustigaram a Califórnia, incluindo Malibu], os deslizamentos de terras e aquele espírito muito típico dos pioneiros", diz Lucey.

Malibu – ou "a ‘bu", como é conhecida – tem conseguido permanecer uma comunidade unida. Os segredos são mantidos com discrição, mas sabe-se que já houve tempos loucos ao longo daqueles areais. Nos primórdios daquela "colónia", diz-se que Gloria Swanson entretia o pai de John F. Kennedy, Joseph Kennedy, na casa rústica que ela ali tinha, e em 1965 Jane Fonda organizou uma conhecida festa que durou toda a noite (The Byrds played at dawn – a banda The Byrds tocou até ao amanhecer). Em 1975, Cat Stevens teve o seu "momento de conversão" ao islamismo em Malibu, depois de quase se ter afogado na praia.

A comunidade musical invadiu Malibu em finais da década de 1960 e nos anos 1970, e muitas estrelas rock – demasiadas para se dizer o nome de todas – ali fizeram grandes festas, enquanto jovens esguios balançavam ao som das batidas e fumavam grandes quantidades de marijuana.

Mas isso ficou para trás e agora Malibu tem provavelmente mais em comum com as localidades Locust Valley ou Oyster Bay, de Long Island, do que com a energia hippie do passado. Talvez seja por isso que tantos elementos da "nova colheita" de titãs das finanças, como o milionário Chase Coleman III da Tiger Capital Management (cujo património está avaliado em 6,9 mil milhões de dólares, segundo a Forbes) se refugiaram em Malibu. Steve Schwarzman, fundador do Blackstone Group, também lá tem casa.

Um outro gigante do mundo financeiro, Thomas Laffont, cofundador da Coatue Management, comprou uma propriedade em Malibu por apenas 13 milhões de dólares depois de o devastador incêndio de Woolsey ter destruído mais de 1.643 casas em 2018; Robert Smith, milionário fundador da Vista Private Equity (e um dos investidores negros mais ricos da América) também lá comprou casa em 2016. E muitos outros indivíduos das finanças que são menos conhecidos mudaram-se para a ‘bu, pelo menos temporariamente.

Não há benefícios fiscais por se viver na Califórnia. Mas há uma outra grande razão para ser uma zona tão atrativa. "O tempo", diz Grisanti. "Em que outro lugar podemos estar sempre no verão, exceto em seis semanas do ano? Quando chove, as pessoas largam aquilo que estão a fazer e saem dos seus escritórios para observar", acrescenta.

Créditos: Daisy Prince / The Telegraph

Tradução: Carla Pedro

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